Por Bruno Bezerra, diretor de negócios e tecnologia da MV
Enquanto a interoperabilidade ainda carece de maior estímulo no setor de Saúde, as discussões sobre um sistema open health, baseado no compartilhamento de dados, avançam, especialmente a partir da recomendação do Ministério da Saúde de emitir uma medida provisória sobre o tema e da promessa da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) em lançar uma nova plataforma para facilitar a portabilidade entre os planos de saúde daqui a 90 dias.
A ideia do compartilhamento de dados, aliás, não é nova e foi inspirada no open banking, uma iniciativa que já está em andamento e é regulamentada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) e o Banco Central (BC). Dentro do setor da Saúde, no entanto, tal proposta predispõe uma mudança cultural importante, uma vez que a gestão de planos de Saúde sempre se preocupou em preservar e manter os dados dos beneficiários em sigilo. Por isso, o ato de compartilhar deve ser mesmo a primeira — e principal — trava a ser enfrentada para que o projeto caminhe adiante e todos entendam que o compartilhamento de dados pode ser benéfico também do ponto de vista de negócios.
“A interoperabilidade é a troca de informações entre diferentes plataformas, seguindo os preceitos da LGPD. Por isso, para que esse intercâmbio de dados funcione bem, é preciso que ocorra a integração de sistemas de diferentes verticais da operadora, ou até mesmo entre operadora e prestadores. Mas, se esse investimento é inevitável, o ganho também é garantido a partir de uma visão completa e holística do paciente, permitindo um plano clínico facilitado”, resume Valmir Júnior, diretor comercial de produto da MV, durante um meeting no MV Experience Forum 2022, realizado nos dias 27 e 28 de julho, em São Paulo.
Por que investir em interoperabilidade?
O benefício a que Valmir se refere é possível por uma questão simples: acesso à informação. “Com tudo no mesmo lugar, e os dados agrupados, é esperado um maior engajamento do usuário médico ao sistema, o que, claro, logo é percebida em uma maior segurança do paciente”, complementa.
A interoperabilidade, nesse quesito, pode evitar retrabalhos na farmácia hospitalar, como o cadastro de interações medicamentosas em diferentes plataformas, além de reduzir o custo por não haver necessidade de refação de exames diagnósticos que foram realizados há pouco tempo, por exemplo. “Com o compartilhamento de dados, eu consigo fazer a coordenação do cuidado com muito mais facilidade e redução geral de custos, já que sei exatamente onde estão as informações do paciente, quando eu precisar delas”, conta Alexandre Freire, CTO da Sami Saúde, operadora que já faz a interoperabilidade dos dados, mediante a autorização de seus beneficiários.
A confiança do cliente em seu plano de Saúde também será fundamental para que a interoperabilidade se expanda na medida necessária para mudar culturalmente o setor: “Sabemos do desafio em explicar as vantagens para uma pessoa leiga, mas as duas maiores delas são logo percebidas por quem usa o plano de Saúde: comodidade em ter os resultados de exames sempre à mão, sem precisar mais carregar pastas cheias de papéis a todos os médicos, e segurança, em saber que informações realmente importantes – como uma alergia a medicamentos – estarão disponíveis no PEP independentemente de onde o paciente for se consultar”, lista Freire.
Principais desafios
Para Bruno Bezerra, diretor de negócios e tecnologia da MV, diferentemente do que muitos acreditam, o maior desafio não está na tecnologia em si, uma vez que os novos softwares já usam padrões para open health: “Talvez a maior dificuldade estrutural hoje esteja em fazer os sistemas que já funcionam trabalhar em novos padrões”, argumenta.
No entanto, a questão cultural é apontada como a maior dificuldade a ser superada por todos, enfatiza Bezerra: “Até mesmo as operadoras de Saúde que iniciaram projetos com o conceito RES [registro eletrônico de Saúde] não colheram os benefícios imaginados por causa da resistência no compartilhamento de dados”.
A integração de todos os setores da Saúde, portanto, depende de uma mudança de paradigma que requer a atenção de toda a sociedade: “Se todos nós, antes de tudo, somos potenciais pacientes e beneficiários do sistema, talvez seja a hora de nos movimentarmos para querer que o open health, de fato, saia do papel”, sugere Bezerra, ao lembrar: “Nós somos os donos das nossas informações de Saúde. É hora de usarmos isso a nosso favor.”