Artigo | O futuro do Direito: transformações, tendências e impactos tecnológicos

*Por Isabela Franco, Legal Expert do Jusbrasil

Não é novidade que o setor jurídico brasileiro tem passado por diversas transformações ao longo dos últimos anos. Com mais de 1,3 milhão de advogados registrados na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o país possui uma das maiores densidades de advogados por habitante no mundo: cerca de 1 para cada 164 pessoas, segundo estudo realizado pela FGV em parceria com a OAB em 2024¹.

Esse cenário contrasta com o dos Estados Unidos, que têm um número semelhante de profissionais, mas apresentam diferenças significativas nos aspectos demográficos, culturais e organizacionais, como apontado por uma pesquisa da American Bar Association (ABA)². Essas distinções mostram que comparações entre o mercado jurídico brasileiro e o internacional precisam ser feitas com cuidado, levando em conta os diferentes contextos. No caso dos EUA, essa análise ganha relevância por serem o berço das maiores legaltechs do mundo.

O mercado jurídico brasileiro – predominantemente composto por jovens profissionais (29,49% com até cinco anos de inscrição na OAB) – apresenta desafios e oportunidades únicas que moldarão o futuro do Direito nos próximos anos. A tecnologia está transformando profundamente a prática jurídica, proporcionando a construção de soluções inovadoras tanto para advogados quanto para a sociedade. Desde a promulgação da Lei nº 11.419/2006, que informatizou o processo judicial, o Brasil viu a explosão da transformação digital no setor. A digitalização permitiu o acesso mais fácil a dados do Poder Judiciário, criando as bases para o desenvolvimento de inteligência jurídica e soluções tecnológicas de grande impacto.

Legaltechs, escritórios de advocacia e departamentos jurídicos estão investindo cada vez mais em organização e análise de dados para aumentar a eficiência operacional. A inteligência artificial generativa (GenAI), em particular, desponta como uma ferramenta poderosa, pois tem o condão de potencializar a realização de atividades essenciais para os profissionais do Direito – como pesquisa jurídica, análise de contratos e elaboração de documentos. O diferencial está no fato de que a tecnologia tem capacidade de analisar grandes volumes de informações e identificar padrões em escala, tornando atividades com alta demanda cognitiva mais rápidas e eficazes.

A expectativa é que, com o tempo, ferramentas desenvolvidas com GenAI tornem-se essenciais na rotina destes profissionais, na medida em que permitirão a entrega de resultados com qualidade e em menor tempo A consequência é o aumento de sua disponibilidade para lidar com estratégias mais complexas e criativas.

Dados abertos e democratização da informação jurídica

A publicidade dos dados do Poder Judiciário tem previsão constitucional no Brasil e desempenha um papel crucial no avanço de soluções tecnológicas para o setor jurídico. Assim como o desenvolvimento da inteligência artificial generativa só foi possível com a concretização do que se chama de big data, o desenvolvimento de soluções tecnológicas aplicadas ao mercado jurídico depende da publicização dos dados associados à informação desta natureza. Inteligências disruptivas são construídas a partir de bases de dados qualitativamente significativas e quantitativamente expressivas.

Nesse sentido, vale, novamente, trazer o estudo comparativo dos Estados Unidos, onde a realidade da tradição common law permitiu a consolidação de produtos que há décadas sistematizam a jurisprudência publicada pelas cortes no padrão dos denominados case reports. Não por acaso, players como Westlaw e LexisNexis têm uma penetração extremamente significativa na prática dos advogados no país. Basta uma busca rápida sobre metodologia de pesquisa jurídica no Direito americano para perceber o impacto dessas plataformas: doutrinas e sites de faculdades renomadas ensinam o passo a passo, incluindo orientações específicas sobre o uso dessas ferramentas.

Enquanto isso, os tribunais brasileiros ainda enfrentam o desafio de lidar com publicações dispersas. Apesar da complexidade informacional, esse cenário destaca o potencial das soluções que estão sendo desenvolvidas para transformar verdadeiramente a atividade central da advocacia. Essas inovações locais prometem aumentar a eficiência e os resultados, atendendo às particularidades do sistema jurídico brasileiro.

Por fim, ainda falando de dados públicos, é importante destacar uma questão social: o cidadão que tem acesso à informação jurídica toma consciência de seus direitos e deveres e, com isso, passa a ver a relevância do Direito no seu dia a dia. As relações tornam-se mais estáveis, contratos e negociações são desenvolvidos em um ambiente de paridade e comunicação clara. Em última instância, o impacto da publicidade dos dados é devolvido ao Poder Judiciário, pois a estabilidade das relações sociais diminui o fenômeno da litigância.

Oportunidades para a advocacia do futuro

O futuro da advocacia será marcado pela integração entre Direito e tecnologia. Os advogados continuarão atuando como sempre fizeram. No futuro, todavia, terão à sua disposição instrumentos extremamente confiáveis e eficientes para auxiliá-los na realização do seu ofício. Ferramentas inovadoras, como inteligência artificial, proporcionarão mais produtividade, acessibilidade e eficiência aos profissionais. Isso também abrirá novas possibilidades de atuação, com a diversificação de funções para profissionais do Direito.

Para que essa transformação seja bem-sucedida, é fundamental superar o conservadorismo que ainda predomina no setor e adotar uma postura de curiosidade e abertura às inovações. Pesquisas já mostram que os advogados reconhecem os benefícios da modernização e estão dispostos a adotar ferramentas que otimizem sua atuação.

Em síntese, o setor jurídico brasileiro tem um futuro promissor, impulsionado pela tecnologia e pela cultura de dados abertos. Com uma regulamentação eficaz, investimentos em inovação e um mercado jovem e dinâmico, o Brasil se destaca como um terreno fértil para mudanças significativas.

*Isabela Franco, Legal Expert do Jusbrasil, maior plataforma de inteligência jurídica do Brasil, com uma base de mais de 1,2 bilhão de documentos públicos e mais de 30 milhões de usuários mensais

¹ Perfil adv : 1º estudo demográfico da advocacia brasileira / coordenador: José Alberto Simonetti, Rafael de Assis Horn, Luis Felipe Salomão –  Brasília ; Rio de Janeiro: OAB Nacional ; FGV Justiça, 2024. 210 p.; il. Consultado em 22 de janeiro de 2025

² https://www.americanbar.org/news/profile-legal-profession/demographics/

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